sábado, 21 de novembro de 2009

PRECISO OLHAR - Festival Goiânia em Cena


Foto: Layza Vasconcelos
Crítica: Prof. Nilton Rodrigues



PRECISO OLHAR - CIA DE TEATRO NU ESCURO

Tenho podido ver, nesta edição do Goiânia Em Cena, alguns espetáculos e até participar ou assistir a um ou outro seminário ou debate, formal ou informal. E tenho gostado. Me embevece ver o desejo de crescimento, a busca da excelência etc... de superar-se. Isso só pode resultar em coisa muito boa. Bom que a cena anda viva. Parabenizo pela realização do festival, parabenizo os participantes. Como cidadão desta urbe, agradeço a oportunidade de ver tanta diversidade, tanta riqueza nessa curta temporada. Quiçá, além de repetir-se este evento, a cada ano, haja mais intercâmbio entre esses artistas, e o poder público não fuja à tarefa de promover as artes e a cultura, e viabilize a vinda de espetáculos de outros centros até esta praça, bem como a ida de espetáculos daqui para outras plagas. Claro, não somente por ocasião desses eventos, mas, regularmente, em qualquer época.
Desejo começar confessando-me Surpreso: O Nu Escuro quebrou a minha expectativa. Esperava o Nu Escuro da rua. Refletindo sobre isso, folheei o minúsculo programa do espetáculo e me deparei com a frase de Mia Couto, utilizada como epigrafe. De certo modo, as coisas se explicam.
Achei bastante curiosa a proposta da estrutura do espetáculo, que parte de uma reflexão sobre o ser e particulariza, paulatinamente, passando para o animal, o homem, simplesmente, depois visto na relação com o seu espaço, o seu espaço físico, daí ao homem goiano, depois o goianiense, até chegar ao indivíduo. Nessa fase, cada um dos atores assume uma personagem que tem o seu próprio nome – não importa se essa personagem remete ou não à individualidade do próprio ator. Estamos de novo na esfera do SER – seus conflitos, seus anseios, seus medos... Reuniversalizamos o enfoque. Estamos tratando do universal porque nosso assunto agora é o nosso próprio quintal.
E nesse percurso se faz uma crítica leve, embora mordaz, aos hábitos comuns de nossa cultura, inclusive a culinária. E a julgar pelos dados informados, como é calórica nossa dieta. No bojo dessa crítica, o espetáculo encontra espaço para falar sobre teatro. E de modo despojado: com uma frase tomada como bordão: “qual é a última coisa que você faria?”, dita, não dá pra saber se de propósito ou não, de modo distorcido: “qual é a última coisa que você NÃO faria?” – Sim, porque a última coisa que qualquer um não faria, talvez seja aquela que faça em primeiro lugar – há um raro momento em que o teatro atinge uma de suas funções mais caras: fazer-nos rir de nós mesmos.
Foi delicioso ver a cena se repetir segundo diversas concepções cênicas. Que prato cheio para uma plateia formada majoritariamente por gente de teatro. E é impossível deixar de ver aí a crítica aos equívocos de “rotulação”, aos modismos, à apreensão apenas da aparência de concepções que nos encantam, mas que talvez devessem amadurecer mais em nós, para que pudéssemos ousar a realização de espetáculos verdadeiramente vivos. Concepções com que talvez jamais nos identifiquemos, mas que não deixam de ser bem-vindas, porque, antropofagamente, teremos de degluti-las, reelaborá-las conforme nossa cultura e reinventá-las a nosso modo. Mas não é por aí que pretendo seguir. Preciso olhar o espetáculo Preciso Olhar.
Quero ressaltar a simplicidade de tudo. Postura, linguagem, elementos da cena, despojamento... E a auto-crítica que a companhia faz em plena cena. Concordo com algumas. Falta criatividade na utilização de aviõezinhos de plástico, industrializados... A cena ficaria belíssima se invadida por aviõezinhos de papel, desses feitos em dobradura simples com que tanto brincamos na infância. Há outros pormenores.
O Hélio Fróes, mais de uma vez, alertou: “gente, falta dramaturgia!”. É aí que mais concordo. Ainda assim, em parte. Tocantes as cenas em que cada uma das personagens/atores fala de si mesma: seus medos, seus bloqueios, seus limites... Que poesia na cena em que Izabela Nascente fala de sua opção por ser atriz.
Mas, no todo, o espetáculo me pareceu carente de unidade. Faltou amarração, transição sem baques, de uma cena para outra. Vi fragmentado o espetáculo, em “saltos”. Mais ou menos assim, como este comentário. Desculpem. É que eu sou aprendiz de plateia. E me dou por satisfeito se puder contribuir, ainda que minimamente, para que esses meninos (se me permitem chamá-los assim) que vivem tão seriamente a opção que fizeram, prossigam em sua jornada, trazendo sempre espetáculos de altíssimo nível.
E que continuem nos surpreendendo.
Obrigado.

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