Prestes a completar 15 anos de história, a cia. goiana de teatro Nu Escuro inicia turnê para celebrar uma trajetória de desafios e conquistas. Dramaturgia se mistura à música, ao circo e à dança em universo lúdico e poético.

Foto de Rubens Cerqueira. Espetáculo Preciso Olhar
No palco italiano ou em praça pública, para a Cia. de Teatro Nu Escuro, o espaço não importa. Por onde quer que passe, ela encanta as plateias com a magia e vitalidade de suas performances. Dramaturgia se mistura com música, circo, dança e bonecos, revelando um universo lúdico, envolvente e poético. Com 12 espetáculos no currículo, a companhia, que tem raízes no teatro popular, não abandonou outras formas de encenação e estabeleceu um trabalho contínuo de pesquisa, experimentando novas linguagens e ampliando suas técnicas.
O resultado é uma relação de perfeita sintonia entre espetáculo e público, um diálogo estabelecido por uma arte autêntica e ousada. Este ano, o grupo recebeu o Prêmio Funarte de Teatro Myrian Muniz e inaugura amanhã, no Centro Municipal de Cultura Goiânia Ouro, o projeto De Dentro do Centro, com a apresentação do espetáculo O alienista. Por meio do projeto, a companhia vai percorrer algumas capitais brasileiras e comemorar 14 anos de uma trajetória de desafios e conquistas.
Trajetória
O grupo nasceu do sonho de jovens estudantes da antiga Escola Técnica Federal de Goiás (ETF-GO). Apesar de ser apenas uma atividade extracurricular, o teatro era a verdadeira paixão de Lázaro Tuim e Hélio Fróes. Depois de concluir os cursos, eles desistiram de seguir as carreiras em nome do amor às artes cênicas. Mais tarde, encontraram Abílio Carrascal, Izabela Nascente e Adriana Brito. Surgia um grupo jovem, mas cheio de vontade de concretizar suas aspirações. “Nu Escuro vem da curiosidade de estar sempre à procura de algo, inteiro e desnudo para as novas experiências”, destaca a atriz Izabela Nascente, ao definir a companhia, que passou por dificuldades para se estabelecer. Segundo Izabela, eles enfrentaram as típicas situações da profissão de artista, como falta de dinheiro para viabilizar as produções e descrédito da sociedade. “As dificuldades vieram quando resolvemos nos profissionalizar, mas à medida que assumimos os riscos, as coisas passaram a acontecer. Ao mesmo tempo que mostrávamos o nosso trabalho, as portas se abriam”, lembra a atriz.
Para o ator Lázaro Tuim, além das questões financeiras, outra dificuldade é aquela que proporciona um grande prazer. “Ao mesmo tempo que é difícil, é uma satisfação escolher qual peça montar, de que maneira vamos estabelecer o diálogo com o público, por qual estética ou linguagem optar”, destacou o ator. Ao falar da convivência estabelecida pela proximidade do grupo, ele afirma que essa relação de trabalho fez do Nu Escuro uma grande família. “É uma espécie de casamento, parece uma trupe de circo que pega a estrada um pouco sem rumo. E precisamos entender que essas relações também são constituídas de fases boas ou ruins, no entanto, essas questões são fáceis de superar”, ressalta o ator.
O Nu Escuro é um grupo que superou os desafios com o objetivo de continuar trabalhando e acreditando no sonho de poder fazer um teatro comprometido com a sociedade e com a arte. “Não são apenas aqueles que estão no palco, várias pessoas tornam esse ideal possível. Costureiras, técnicos, bilheteiros, motoristas, amigos e familiares ajudam a realizar os projetos da companhia”, lembra Tuim. Com nostalgia, ele ainda coloca que, depois de tanto tempo, todos os integrantes ainda continuam com o mesmo amor para se dedicar aos palcos. “A sedução do teatro é inesgotável. Quanto mais estudamos e trabalhamos, mais nos apaixonamos pelo teatro, pelas possibilidades de reflexão, desvelamento do homem e da vida que a arte pode suscitar”, afirma.
Os próprios componentes do grupo não visualizavam a dimensão do projeto e a grandiosidade que ele iria adquirir futuramente. “Na realidade, não sabíamos onde queríamos chegar, estávamos dando um tiro no escuro. Esse é um dos motivos do nome da companhia”, destaca Tuim. Para ele, o único desejo naquele momento era viver do teatro, mas existia o medo e a dúvida de qual caminho trilhar. Ele confidencia que, na época, havia uma desconfiança das próprias famílias que sonhavam ver os filhos trabalhando como técnicos e colocando em prática o que aprenderam em seus cursos. Porém, esses receios desapareceram quando o grupo começou a mostrar seriedade e profissionalismo por meio de seus espetáculos que ganhavam projeção.
Processo de criação
Nas 11 obras que o Nu Escuro apresentou, o público teve contato com a versatilidade única da companhia. Vencedores de vários prêmios importantes para as artes cênicas, o grupo leva seus espetáculos a várias partes do País e é recebido de maneira calorosa por uma plateia heterogênea. Em 14 anos de trajetória, eles já foram dirigidos por diretores renomados, como o uruguaio Hugo Rodas e o coreógrafo e diretor da Quasar Cia. de Dança, Henrique Rodovalho. Com uma abordagem cômica, popular e sensível, o grupo se estabeleceu na cena teatral do Brasil.
Ao destacar a importância dos diretores Henrique Rodovalho e Hugo Rodas no processo de criação dos espetáculos O Alienista e Preciso Olhar, a atriz Izabela Nascente ressaltou que a contribuição de ambos trouxe uma nova emoção para o grupo. “O Hugo nos exigiu uma vitalidade em cena , a paixão pelo teatro. Nos ensinou uma força arrebatadora que tentamos conservar em nosso trabalho”, afirma a atriz. Segundo ela, Rodovalho já era uma paixão antiga. “Temos contato com ele desde a gênese do nosso grupo, quando ainda era professor na Escola Técnica e, nessa época, junto com a Quasar, eram referência em nosso trabalho”, ressalta. Ela completa que, no espetáculo Preciso Olhar, só foi possível com a disciplina que Rodovalho tem na produção de pensamento. “O trabalho dele é muito interessante, um geniozinho querido que eu adoro”, brinca Izabela Nascente.
Experiência
“Costumo chamar a Cia. de Teatro Nu Escuro de grupo idoso”, destaca a atriz Adriana Brito, que completa uma década de companhia. Essa definição serve para dizer que os anos de estrada trouxeram uma grande experiência profissional. “Amo trabalhar com todas as pessoas do grupo, temos muita cumplicidade e nos tornamos uma família”, ressalta Adriana. A Cia. de Teatro Nu Escuro é um grupo bastante democrático. Nas vezes em que não convidaram diretores para conceber os espetáculos, algum componente do grupo se dedicou à direção, como aconteceu com a atriz Izabela Nascente. Logo após ter feito uma oficina com o grupo Gira Mundo de Bonecos de Belo Horizonte, ela propôs a montagem de um espetáculo de bonecos, o que foi absorvido como possibilidade de estudo em uma nova linguagem teatral. O projeto De Dentro do Centro é uma circulação do repertório da companhia por Goiás, pelos Estados que fazem divisa e também pelo Distrito Federal, promovendo um intercâmbio com grupos de teatro desses locais. O Nu Escuro vai passar por Palmas (TO), Brasília (DF), Belo Horizonte (MG), Salvador (BA), Cuiabá (MT) e Campo Grande (MS) com os espetáculos O Alienista, Preciso Olhar, O cabra que matou as cabras, Envelopes e Carro caído.
O Alienista, com Cia. de Teatro Nu Escuro
Dia: Amanhã (quinta-feira)
Horário: 21h
Local: Goiânia Ouro - Teatro
Endereço: Rua 3, esquina com Rua 9, Centro
Ingressos: R$ 10 inteira e R$ 5 meia
Capa do DM Revista, Diário da Manhã, 06/10/2010
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